Da interminável e densa e intensa batalha entre memória e história, o que resta são palavras. Só palavras.
Serão eventualmente garimpadas nos escombros do futuro. Estão convidados, porém, a revirar hoje o blogue pelo avesso.
2 de mar. de 2010
GESTOS NO BAR
Caio Martins
À Silvana - Peña Cauã.
(img:cvm -lucienne037 - tela)
Estes bares noturnos, moça
são antros de gente perigosa.
Em que pese, são (e)ternos
os músicos mercenários
as bem amadas triunfantes
os amantes latinos
as mal-amadas teatrais
os solitários de sempre
e até mesmo teu poeta
de incêndios orquestrais.
Hermético, teu gesto
jogando negros cabelos
tua afoita blusa exótica
deslizando sem escombros:
- Que belos ombros...
És toda uma mulher
e me assombro, moça
com tua cortante beleza
em sapatinhos de cristal.
A luz raquítica
musica arcos-íris
no compasso de teus braços,
movimento
de dança de teus seios...
(lamento a mesa te ocultando a cintura).
Que cores raras tem a música!
Que gula, no ritual de olhares!
Te falo, invento histórias
falo, falo, falo
e desmonta-se em frangalhos
tanto cenário, e calo...
Cabeça dura, teimosia
seguir querendo ver-te
em meu corpo
a bailar nua.
Guardamos nas sombras das roupas
nas dobras do tremor das ruas
arsenais de sorrisos
armadilhas de palavras
etéreos e afiados punhais.
Nos olhamos intimidados
cúmplices, irreais
o garçom passa e pisca
em fantasia pomposa.
É que estes bares noturnos, moça
são antro de gente perigosa.
(Peña Cauan. Pensão da Zulmira -15/04/1987).
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Belos ombros. ;)
ResponderExcluirFábio, bela mulher...
ResponderExcluirCaio, belo poema...
Cuidado com os bares noturnos...
ResponderExcluirAdorei, Caio.
Fantástico!!!
ResponderExcluirParabéns pela escolha.
Muito bom vir aqui.
Abraços...
Fábio, uma honra, tê-lo por aqui. A Musa da estória excedia os limites da morenice faceira, bela mulher e pessoa. O poema não lhe faz juz, ante alguns espetáculos da natureza somos, todos, poetas menores.
ResponderExcluirJacy, a Vida, em seus mistérios, sempre faz ponto e contraponto. Cria as Musas e os poetas, e parece divertir-se com isso.
Vanessa, sensualidade é um dom de limites extremamentes frágeis: um pequeno exagero, e Musa vira Mocréia... Havendo inteligência e sensibilidade, talento e sabedoria, é inútil qualquer resistência. Estaremos definitivamente perdidos, não importam os perigos da noite.
Angélica, canceriana braba... Um prazer, sua visita. Gostei muito do "Deu vontade de abraço", no seu blog. Quem fotografou sabe das coisas, quem postou sabe eleger.
A todos, gratidão pela visita, e forte abraço.
Posso repetir Guimarães Rosa?
ResponderExcluir"Viver é muito perigoso."
Caio deu uma demonstração.
E os descaminhos da paixão e do desejo, Grande Sader muito mais. Há muita solidão pela noite em busca do amor definitivo, mas, caindo nas armadilhas do precário da paixão. Todavia, segue-se a regra do jogo: não há regras. Haja "nervos de aço" nesse imbróglio.
ResponderExcluirCaio,
ResponderExcluirlindas as tuas palavras...
desejo, libido, luzes e sombras... e ela ali, do outro lado da mesa, nua... sim, ela estava nua...
parabéns !
beijo
Solange, honrado com sua presença. Bela perspicácia: a moça não estava nua... mas, estava... ao menos na cabeça dura do poeta. As memórias do corpo têm força extraordinária, raramente podemos transmiti-las, senão na pintura e na escultura.
ResponderExcluirAí passa o garçom da espelunca vestido de gala, pisca e volta-se à realidade. Restam as pobres palavras.
Há que seguir a trilha dos eucaliptos, inda que longe de janelas.
Son ya veinte y tres años pasados y parece que fué ayer... El mago de las tumbadoras y la morocha divina más enamorados que gatos en el celo. Y Sergito cantando Guajira mejor que Santana:
ResponderExcluir- vamonos guajira, vamos a bailar - Que escenario lindo. Pasó nomás...
Ramón el Negro.
eu que vivo por esse bares posso então me considerar uma pessoa perigosa
ResponderExcluirNegro,surpreza das boas. Cauã, Los Hermanos e Casa Rosada marcaram um precioso momento latino em São Paulo, que tivemos o privilégio de viver. Feliz por sua visita, volte sempre.
ResponderExcluirEdiney, um prazer, vê-lo aqui.
"No fim tu hás de ver
que só as coisas mais leves
são as únicas que o vento
não conseguiu levar”, diz Quintana... Certo?
Poetas são, por si, perigosos; se boêmios e libertários, mais perigosos ainda... e ante o noturno, intangível e leve candor feminino, não há desastres que não cometam...
Cuide-se: a noite com seus punhais, se maltratada, é vingativa e traiçoeira. Esses bares...
Neste poema repleto de imagens que fascinam, o terno e eterno poeta é solitário e ao mesmo tempo solidário - os sentimentos se misturam num determinado momento...
ResponderExcluir"É que estes bares noturnos, moça
são antro de gente perigosa."
E, no meio do caminho, a fala maliciosa toma conta do cenário...o poeta não mais está só - já faz parte do cenário dos bares noturnos...
"...Te falo, invento histórias
falo, falo, falo
e desmonta-se em frangalhos..."
O poeta não quer mais ser solidário.
Beijos
Márcia
Márcia, suas palavras são honra que muito me envaidece. Se o primeiro texto citado é o de preocupação solidária, o segundo - detonado pelo deslisamento místico da blusa - é o "núcleo gerador" do poema...
ResponderExcluirFalo, se verbo ou substantivo, ou ambos, determina o entendimento da cena. Igualam-se nos arsenais de caça, cedem num piscar de olhos do garção confirmando a profecia, espécie de "- eu te falei", ao final. Assim, até a próxima vez, a solidão entre atos.
Caio, que lindo poema. Moça de sorte, acredito eu.
ResponderExcluirSensualidade aflorada em todas as linhas e mais ainda o cuidado com tal amada...
Gostei.
Beijão
Sol, entre mortos e feridos, todos tiveram sorte... A "peña" latina Cauã fechou, seus músicos se espalharam pelo mundo, a moça e o poeta pegaram, passado o momento de cio (mencionado acima pelo Ramón) e cuidados mútuos, órbitas próprias em galáxias desconhecidas.
ResponderExcluirFicaram estórias, que o povo conta.
Abração: sempre um prazer, a sua visita.
Nos bares noturnos gente perigosa.
ResponderExcluir"O que esse punhal tem de arma são as asas da imaginação"...
Dualidades.
Nos noturnos bares a dualidade é generosa também.
Bárbara,diria que a imaginação é que tem, de armas, esses "punhais" metafóricos. Nada de aço ou metais: tudo de gestos, atitudes, palavras, no diletante duelo para decidir quem janta quem... e, a generosidade, fica por conta da sobremesa.
ResponderExcluirBelíssima, a referência a Quintana no "Então, enfim"... no seu blog.
Beijos, muito bom vê-la por aqui.
Os bar, a madrugada, a música, o decote de uma mulher...suscitam poesia. E esses antros perigosos - Oh,Deus, protegei-me -são uma mina de emoções benfazejas que espanam a mesmice e deixam lembranças. Pelo menos uma, inesquecível. Cabe a cada qual guardar a sua. Omitirei a minha por enquanto...
ResponderExcluirTeresinha, a noite exige audácia, pelo contexto de magia. Há quem a venere, há quem a devore. Há, mais, que vivê-la, de preferência aos golinhos.
ResponderExcluirGrato pela visita, volte sempre.
Caio.