Caio Martins.
- dizem os jornais -
o planeta centenas de vezes,
o planeta centenas de vezes,
- Que coisa!... uma só seria demais...
Ao léu pasta o gado
ao matadouro
pasta o gado...
O poeta é um saltimbanco
o poema é um vagabundo
que pode um verso inútil
contra um míssil nuclear?
A bomba de nêutrons
derreterá a arte
ninguém dá parte
e pelas avenidas se entulham
androides enlatados
em conserva, entalados
cuja sobrevivência é um vício
cuja inconsciência é um ofício.
Ao léu pasta o gado
ao matadouro
pasta o gado...
No espaço sideral há brilhos
sinistros de metais
enquanto a vida abaixo escorre
condenada
desenfreada
por trilhos virtuais.
Ao léu pasta o gado
ao matadouro
pasta o gado...
No limite do planeta
os limites por um triz
a liberdade ancilosada
é velha locomotiva a vapor
se decompondo nas pradarias
enquanto em órbitas, estelares
espaciais engenhos reluzentes
se (de)codificam, frenéticos
sobre os destinos do planeta
e seus piolhos patéticos...
Ao léu pasta o gado
ao matadouro
pasta o gado...
(26/06/1987 - Pensão da Zulmira)
E o poeta tem a vocação de desentalar a conversa, dizer o que vai no homem... no gado... na poeira das sobras deste mundo vagabundo.
ResponderExcluirAbraços meu poeta.
Que poema forte, Caio! Apesar de escrito em 1987, é atualíssimo - parece ter acabado de sair do forno... E a realidade, infelizmente, é esta descrita por você através de imagens belíssimas...
ResponderExcluirAté quando a humanidade continuará insistindo em ignorar sua própria existência, em negar sua permanência?
Destaco estes versos, de beleza e consistência únicas:
"...que pode um verso inútil
contra um míssil nuclear?"
"...e pelas avenidas se entulham
androides enlatados
em conserva, entalados
cuja sobrevivência é um vício
cuja inconsciência é um ofício...."
Bravo!
Beijos e grata pela partilha.
Márcia
O todo do poema convence um frade de pedra. Interessante. Logo que vi a expressão "...que pode um verso inútil
ResponderExcluircontra um míssil nuclear?", achei a mesma muito forte. E Márcia destacou os mesmos versos, o que prova serem expressivos de verdade!
Grande abraço, Caio.
Jorge
Casciano, ou a despena, ou mais a enruste. No fundo o poeta espera nunca ser profeta, mas, de vez em quando canta a bola e a caçapa...
ResponderExcluirForte abraço, grato pela presença.
Márcia e Jorge Sader, fins do século XIX, a humanidade desatou de vez o processo de destruição da Natureza pela voracidade de devorá-la. A Arte, inútil, não tem como enfrentas a compulsão destrutiva. Mas, há que seguir tentando...
Beijos, meus amigos queridos.
Caio
ResponderExcluirJá disse alhures que o leitor tantas vezes interpreta aquilo que o autor não quis dizer. Mas, vou lá: tenho a impressão que a boiada tem muito de nós mesmos. Belo poema. Milton Martins
Grande Milton Martins, por ação ou omissão, somos todos nós. Você tem insistido muito nos riscos aos quais o planetinha alucinado está sujeito. Não há mais inocentes, mas a compulsão destrutiva não finda. Ao contrário, se agrava.
ResponderExcluirVamos, todavia, seguir insistindo, com os recursos que dispomos. Há que lutar a boa luta!
Abraços, grato por suas palavras.