(Elis - Sabiá, de Chico Buarque e Tom Jobim - 1968.)
Caio Martins
(Terceiro Exílio)
(img: cvm - den230/2001)
A casa fincada na esquina
era sempre uma escolha,
uma decisão, ninguém
ficaria além do necessário .
Já da rua anterior à casa
vieram amigos, conhecidos
poetas, os artistas todos
boêmios, bêbados, mulheres
da vida, baratas e de luxo,
os suicidas
um amontoado de crianças tristes
avisar do som de passos
que a vida seria punida.
Já antes, na casa, a mulher
beijara meu rosto, a face
parcamente em lágrimas
enquanto um homem sério perguntava
o endereço de lugar nenhum
mudo
farto de despedidas.
Já antes dos sons de passos
silenciosos pela rua escura
trouxera das mãos só frases tronchas
e da boca nenhum verso esfarrapado.
Em cabeças ocas as palavras
ressoam imponentes e fáceis
acelerando o sangue nas veias
pedindo, as pessoas tontas
perdão por crimes impossíveis
tempo nenhum praticados:
- Mea culpa! Mea culpa! Mea maxima culpa...
Vieram os passos silentes
e a casa da esquina ruiu
pedaço a pedaço, devagar
e gritos de revolta
não feriram meus ouvidos.
O mundo já estava torto.
Elevaram-se cantos lamentosos
a mulher viu-se inocente e destruiu
a casa das decisões mais graves
e o epitáfio do amor mais lindo
com simples palavras claras
rasgando paredes sujas:
- Perdão! Eu te amo!
Ficou na sombra a frase amarga
nas mãos o verso inóspito
na garganta teu nome embriagado:
- LAURA!... Laura...
O mundo já estava morto.
(CASCS-17/04/1968 - SP-29/07/2010.)
Bem vindo de volta.Magnificamente!
ResponderExcluir(Festejando merecidamente)Bj
Uma tristeza, quando o mundo acaba assim.
ResponderExcluirMas como nada é para sempre, a gente chora e continua...
Está muito bem escrito, Caio. Parabéns pela volta.
Abraço,
Jorge
Realmente bacana...abraço!
ResponderExcluirO exílio é sempre solitário, não? Mesmo que rodeados de pessoas com afinidades, não há como não doer demais. A saudade aperta, o medo do que pode estar prestes a acontecer por vezes parece inundar nossa mente, nosso corpo, nosso mundo.
ResponderExcluirÉ como você diz:
"O mundo já estava torto (...)
O mundo já estava morto."
Lindo poema, Caio!
Beijos
Márcia
Maria Alice, obrigado. É muito bom contar com sua presença. Obriga a caprichar cada vez mais, um dia aprenderemos. Beijos.
ResponderExcluirSader, não acaba, muda. De aí o extraordinário valor dos amigos, nesta estação. Creio que na próxima também. Eu é que agradeço, meu irmão.
Juan, retribuo o abraço e fico feliz em vê-lo por aqui. Vamo que vamo!
Márcia, o primeiro exílio foi fácil. O segundo bastande difícil. E o de agora muito difícil, de vez que "jamais, na história deste país", valores e princípios foram tão degradados. Resta ser degredado em Pátria própria, sabendo que não haverá mais tempo de voltar. E pagar o preço de despertencer.
Beijos, minha querida amiga.