8 de out. de 2009

ELEGIA MELANCÓLICA


Caio Martins










(img: cvm - sucatas - IRFMatarazzo.)

Não sabes inventar flores.
Apenas existe em ti
a certeza de carregar absurdos
diante destas interrogações todas.

Máscaras grotescas te espiam
dançando em cima do muro.

Tocar violão, ler jornal
andar na rua gritando
música de carnaval...
Adianta, tudo isso?

Mistérios sorridentes
acenam a cada papel que o vento leva.

Pois que leve então o vento
todas as revoltas, todas as violências
que deixares escritas com fel.

Não chegarás a viver os tempos
onde não haja mais negócios
sempre negócios, amigos à parte.

Não chegarás a viver o tempo
de sentar na rua e cantar
por gosto, bobeira, vontade.

Dentre poucas coisas
(complexos, medos
traumas, desejos
teu relógio e a certeza da morte)
carregas em ti a certeza
de não saber inventar flores...

Tudo o mais não é impossível.

7 comentários:

  1. Que triste...mas muito bonito. Quem disse que não há beleza na tristeza de um poeta?
    um abraço

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  2. Melancólicas linhas, nostálgicas e um tanto pressagiosas, em versos bem conduzidos pelo poeta. **abraços!/**

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  3. "Tocar violão, ler jornal
    andar na rua gritando
    música de carnaval...
    Adianta, tudo isso?"

    Só esta quadra já seria o bastante!

    Abraço, Caio.

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  4. Bravo!!!!!!!!!!
    Aplaudo antes de comentar, pode isso?
    Diante destes versos

    " Não chegarás a viver os tempos
    onde não haja mais negócios
    sempre negócios, amigos à parte."


    eu me rendo e digo: gostaria de tê-lo escrito, Caio.
    Só me entristece a constatação de que o vento não escutou seu recado...

    Beijos

    Márcia

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  5. Mari:às vezes, a densidade da vida pode até chegar a oprimir, mas a intensidade prevalece e o escrevinhador metido a besta fica olhando uma das rosas do jardim, e matutando em como inventaram um milagre desses. O resto fica, assim, com jeitão de besteira. Tudo é passagem.

    Rosa:mais que presságio, foi profecia. Vou ao velho e bom Drummond, que disse "viajei, briguei, aprendi" e "teus ombros suportam o mundo, e ele não pesa mais que a mão de uma criança". A melancolia não se dá pelo que fizemos, mas, pelo que deixamos de fazer. A magia está no fato de as palavras terem, conta própria, se empilhado na forma que marcou o poema. Essas coisas acontecem, de vez em quando.

    Jorjão: tiraram essa alegria da gente. Na época, ao menos sabíamos de onde vinha a pancada. Hoje, não há mais hora, está em todo lugar. É quando a vida assume plenamente sua condição de milagre.

    Márcia: vindo de você, fico entre eufórico e constrangido. Sua generosidade comove. Não é fácil escrever para si mesmo, mas o que o vento não levou, alguns furacões limparam a área. Ficou, definitivo, o deslumbramento ante o milagre da vida e, que fique, tudo mais é mera suposição. Voltando ao Carlos, "tudo é possível, só eu impossível"

    A todos, meu carinho e forte abraço.

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  6. Não saber inventar flores, é pisar só em concreto..
    É olhar o relógio, como se fosse possível detê-lo ou fazê-lo agir em demasia..
    como amargura que vira raiz no coração, não saber em meio a tudo, ver flores, é no mínimo virar um ser em sepulcros caíados..

    beijinhos

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  7. Chris, essa é a questão: destruímos compulsivamente o planeta, em nome de deuses ou demônios, e não sabemos preservar a Vida. Contudo, somos imbatíveis em proporcionar a Morte.

    Mesmo dos melhores intencionados, o menor gesto traz em si o estigma da destruição, nossa arte do possível, trasvestida em sepulcros caiados.

    Alguns, enfeitados com flores de plástico. Somos ótimos nesses simulacros de existência.

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Na busca da excelência aprende-se mais com os inimigos que com os amigos. Estes festejam todas nossas besteiras e involuímos. Aqueles, criticam até nossos melhores acertos e nos superamos.

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